Retrato de Bogotá com lentes crioulas (Colombia)

O slogan colombiano "El riesgo es que te quieras quedar" tem toda a sua legitimidade.





Experimentem abordar um viajante de 6 meses, 1 ano ou mais, que esteve a dar a volta ao mundo e perguntem-lhe qual o país preferido. E qual a razão. A resposta roça a unanimidade: Colômbia, pelas pessoas!

Até aí, tudo bem. Não é de se duvidar. Porém, não esperava encontrar a tal calidez, amabilidade, disponibilidade e bom-humor nos habitantes de Bogotá. Afinal de contas, é uma capital metrópole, com 7-8 milhões de habitantes...


Fiz-me chegar à Colômbia por puro "feeling". Algo estaria à minha espera. E como esta vida que temos o privilégio de viver, são dois dias, não havia que pensar muito, abraçar justificações racionais, etc. O que me movia era o desconhecido absoluto, se já conhecesse alguém não seria a mesma coisa. Precisava descobrir tudo à minha maneira e no meu "timming".

Aterrei neste país de humanos, no dia 26 de Maio.

E nos primeiros momentos, confirmei essa intuição. Devo alertar-vos desde já que não a devemos desprezar, de jeito nenhum. Ela, quando nos bate à porta, não está para brincadeiras. 
Agora, convém não confundir intuição com intenção de intuição. 




A primeira experiência com esta gente maravilhosa foi no voo para cá. Um casal da minha idade, muito prestáveis e amáveis, que fizeram com que o tempo de voo se reduzisse a quase nada, pois foi bem aproveitado com dicas e introdução à realidade colombiana.

Logo que cheguei ao Hostal Martinik, em La Candelaria, fui brindada com "la buena onda colombiana" e fizeram questão de me fazer sentir em família. Aqui fiz amigos colombianos, que me ajudaram imenso na minha adaptação. Desde as "chicas" que lá trabalham, como a Rubby, uma artista plástica graúda, da zona Sul da Colômbia e que se encontrava na capital por uma semana. Com estes ingredientes, uma cidadã nem liga às instalações básicas do hostel.

Os colombianos têm esse dom de receber. Desconfio até que a "morabeza" crioula possa ter uma costela colombiana. E tenho pena que ela esteja cada vez mais a abraçar o passado, no nosso arquipélago.





El Estudio, de Botero
A primeira semana foi dedicada a La Candelaria, o centro histórico e de tudo em Bogotá. Museus, teatros, salas de espectáculos, bibliotecas gigantes, centros culturais, esplanadas, restaurantes, cafés, etc. 


Mona Lisa, de Botero


Tive a oportunidade de ver alguns espectáculos de dança contemporânea, enquanto fazia alguns ensaios fotográficos.










Como vinha para tempo indeterminado, não me preocupei em fazer os vistos dos sítios turísticos. Levei o meu tempo. Preparava o meu pequeno-almoço como se todos os dias fossem domingos e saía para caminhar pelas ruas da cidade e observar descomprometidamente.







Ao terceiro dia, esbocei o meu plano de acção, com bastante flexibilidade e dando realce à necessidade de participar em "n" actividades que me permitissem conhecer a cidade, a cultura e a realidade.




Durante toda a primeira semana, andei km´s e km´s a pé em Bogotá, de Sul a Norte, Este a Oeste, à procura de casa. Bogotá permite-nos orientar de uma forma muito rápida e lógica (especialmente para os que já tenham facilidade neste tema). Cidade bastante ortogonal, as ruas e/ou avenidas longitudinais (N/S) chamam-se "carreras" e são numeradas, aumentando no sentido E-W. As transversais chamam-se "calles" e os números aumentam no sentido S-N.






Encontrei o meu poiso no Bairro de San Martin, no final da primeira semana. Divido um pequeno apartamento com o seu dono. "Personal Trainer" de profissão, que por "acaso" é grande amigo do casal do voo.

Situa-se num bairro central e bom, com supermercado, mercado, cinema e ginásio à porta. Tem o Parque Nacional (com verde e mais verde à disposição) a cinco minutos a pé e o Museu Nacional a outros tantos. O apartamento encontra-se a 25 minutos de caminhada de La Candelaria e a 15 minutos da Cinemateca, dois dos locais mais frequentados por mim. Vou a quase todo o lado a pé, esteja a 5 ou 50 minutos de distância. E é por isso que me delicio com as infinitas mensagens que vou encontrando pelo caminho.




Frequentei duas semanas intensivas de espanhol na Escuela Nueva Lengua. Fui seleccionada, após exame de admissão, para um nível avançado, naquele que seria o meu primeiro nível oficial de espanhol. Aquelas duas semanas bastaram para apanhar a gramática que necessitava. Por outro lado, as aulas quase familiares, partilhadas com a Camilla (Brasil), a Min (Coreia) e o Jules (França) tiveram uma forte componente multicultural. Tive a oportunidade de visitar a Laguna Guatavita, com a escola.


Laguna Guatavita


Algures na segunda semana, conheci a amiga de uma amiga, arquitecta e  professora numa das Universidades. A páginas tantas, eu e outra amiga dela, fotógrafa, vimo-nos a assessorar o júri de professores na apresentação de trabalhos académicos de alunos do quarto ano de arquitectura. Uma experiência riquíssima, através da qual pude entrar na vertente espanhola do meu "mundo técnico".




O Cerro Monserrate é um dos símbolos de Bogotá e limita a cidade na parte oriental. Desafiei a altitude no meu segundo fim-de-semana, subindo numa caminhada de 2 km, de 2600m a 3100m de altitude. No topo de Monserrate existe o Santuário "Senor Caido", palco de peregrinações.





O que vos posso dizer sobre Bogotá? Listarei algumas das minhas vivências.

1) POPULAÇÃO

Cidade cosmopolita, de 7-8 milhoes de habitantes, onde as pessoas são humanas, de facto, e os valores permanecem, a alegria de viver é praticamente uma obrigação.




2) CLIMA

Não, não tem o melhor clima do mundo, nem parecido. Talvez até tenha, para os apreciadores do fresquinho. Mas para uma amante de calor e sol, fica a desejar este requisito essencial. Apesar de estar próximo da linha do Equador, pelo facto de estar na zona andina (2600m de altitude), nunca tem temperaturas altas. Tem um clima mais ameno. Mas atenção que quando o sol manda as nuvens passear, mostra o seu poder sem quaisquer problemas. Pelo facto de estarmos mais próximos dos raios solares (pela altitude), a penetração dos mesmos na nossa pele é muito mais intensa.

3) ESTRATOS SOCIAIS

Cidade grande, onde existem bairros pobres e outros riquíssimos. Prédios antigos e outros da última geração.

A capital é dividida (e bem demarcada, oficialmente) por estratos sociais e confesso que este foi aquele requisito que me ficou atravessado. Os bairros são codificados de 1 a 6, consoante o seu estrato social. Quanto mais a norte da cidade, mais aumenta o estrato social. Em contrapartida, dizem que o estrato 1 é aquele que eventualmente nem tenha saneamento ou outras infra-estruturas.

Um cidadão que compra ou arrenda um apartamento no estrato 6, pode contar com preços de água/electricidade/gás/condomínio, etc, exorbitantes.

Como quase sempre, no meio é que está a virtude, o estrato 3 é aquele mais equilibrado. Convém não passar do estrato 4. Sinto-me muito confortável na zona de estrato 3, próximo da área financeira e do centro da cidade.




Para terem uma ideia, a renda mensal de um apartamento T1 no estrato 4 ou 5 custa facilmente mais de 1000 euros. E o condomínio, uns cem euros, como mínimo.

4) CULTURA

Que oferta cultural gigante! Aos domingos, todos os museus são gratuitos. Existem também várias actividades semanais grátis pela cidade, para quem tenha disponibilidade para desfrutar deste privilégio.


Museo Nacional

Museo Nacional


No dia 6 de Agosto, Bogotá completou 475 anos. A programação, inteiramente gratuita, não se resumiu ao próprio dia, mas sim a uma semana de comemoração. Houve de tudo, desde peças teatrais, ciclos de cinema, actividades desportivas, exposições, música ao vivo, etc.




Para terem uma ideia da dimensão desta capital, no dia do aniversário da cidade, houve 27 salas de teatro com exibições. Depois de ter tido um dia cultural em pleno, fui brindada com um senhor espectáculo de jazz ao vivo, numa das salas de teatro mais imponentes e com entrada livre (e sem filtros).




5) CICLOVIA

Domingo é dia sagrado para os colombianos. Todos os domingos e feriados, os Bogotanos saem à rua com as bicicletas, skates, patins, etc, para percorrerem a cidade de uma ponta à outra, nas avenidas largas que são encerradas ao transito e transformadas em ciclovia até às 14 horas. Em família, em grupos de amigos ou na companhia de si mesmos, fazem parte de um colorido de gente alegre a tirar proveito da cidade que lhes pertence.





No 475o aniversario de Bogotá, foi disponibilizada uma ciclovia nocturna (das 18h às 0h), atrevendo-me a dizer que havia mais bicicletas do que ciclistas, tamanha aderência. 

6) VITAMINAS

Em qualquer esquina, há um sumo de fruta natural acabado de fazer, ou uma fruta tropical descascada e à mão de semear. E a preços simbólicos. 





O Salpicon, uma "explosão" de vitaminas, feita com frutas tropicais, é apreciado pela maioria.




7) FERIADOS

Colômbia é conhecida pela sua lista generosa de feriados nacionais. Num único mês, tive a oportunidade de gozar 3 feriados à segunda-feira. Por cá, a palavra descanso tem o seu real significado. Nos domingos e feriados a maioria dos restaurantes fecham, dando oportunidade aos vendedores ambulantes, que invadem as ruas com os sumos, fruta, cachorros quentes, pizzas, maçaroca assada, chouriço assado, etc, etc. 


Coco com "panela" uma espécie de melaço de cana do açúcar


"Chontaduro", fruta que se come cozida. A textura assemelha-se à mandioca cozida


8) PARQUES

Apesar de ter esta dimensão enorme, existem vários parques verdes espalhados pela cidade. E os colombianos sabem tirar partido deles. A partir da tarde de sexta-feira, estão cheios de utilizadores. 

O maior parque é, de facto, uma imensidão e exibe um lago enorme: Parque Simón Bolivar. Aos fins-de-semana é invadido pelos atletas que agradecem a sua existência de todas as formas. 




Aos domingos (conseguem já perceber que este é o dia mais importante da semana), tanto no Parque Bolívar como em outros mais, há aulas de aeróbica de grupo, gratuitas. Durante a manhã toda. É inspirador observar o emaranhado de cores humanas a pular com alegria. Para não falar das aulas, também de acesso livre, de tango, bachata ou salsa, no pátio do Centro Cultural Gabriel Garcia Marquez, também no "dia sagrado".




9) SALSA

O colombiano adora uma salsa e nem sempre é preciso fazer uma noitada. Existem bares, essencialmente, nas zonas universitárias, abertos às 15 horas, onde se pode exibir uns passos de salsa, beber um copo com amigos, com ambiente nocturno. Isto, nos dias de semana.

10) SAUDE

O Sistema de Saude Colombiano divide-se em três tipos.

O mais comum e que se assemelha aos sistemas europeus, EPS, cobre cerca de 60% dos colombianos.

O "sistema de medicina pre-paga" que se assemelha aos seguros de saúde europeus e abrange uma classe abonada de colombianos (15%)

O "sistema gratis", dedicado a pessoas muito pobres, pessoas do campo, mendigos e prostitutas. Funciona nos hospitais públicos e cobre 25% dos colombianos. Claro está que não cobre uma série de coisas, mas o corrente. De qualquer modo, ainda que o sistema possa apresentar lacunas e/ou o serviço possa ser demorado, não deixo de expressar a minha surpresa, pois ele existe e é gratuito para quem precisa.

11) CURIOSIDADES

Comer no Mac Donald´s (passo a publicidade) é chique. Um menu chega a custar 10 euros, enquanto que um menu de almoço saudável e saboroso num restaurante típico colombiano (sopa, prato e sumo de fruta) custa entre 2,5 e 4 euros. Há quem desfile pelas ruas com um copo de refrigerante do MD, mesmo com ele vazio, para mostrar que tem capacidade financeira para pagar uma coca-cola de 5 euros.


Ajiaco, prato típico de Bogotá. Preparado pelo meu companheiro de casa, numa tarde cultural


Existem algumas superstições "tradicionais", sendo o sal o campeão das mesmas. Por exemplo, em hipótese alguma se vende uma libra de sal.

Outra superstição tem a ver com a idade limite para o primeiro corte de cabelo de uma criança. Pelo sim, pelo não, preferem não cortar o cabelo a uma criança com menos de 1 ano de idade, por acreditarem que não falará.


Museo del Oro


O ano novo é normalmente recebido com roupa interior de cor amarela. No dia 31 de Dezembro, algumas pessoas fazem a mala e incluem no pacote, o passaporte e tudo o que necessitariam numa viagem e, às doze badaladas, correm pela rua com a mala, numa distância aproximada de 3 quarteirões, com o intuito de atrair viagens para o novo ano.

As grávidas não escapam às superstições. Há quem acredite que se uma mulher grávida lhes faz uma massagem na zona afectada, a dor desaparece. Por outro lado, se uma mulher grávida mexe o cabelo de alguém, este fica mais bonito e sedoso.

A estatura média dos homens é de 1,65m, sendo 1,55m para a classe feminina. Geralmente, os homens não apreciam parceiras mais altas do que eles, chegando a proibi-las de usar saltos altos. Por outro lado, normalmente, o homem é cerca de 5-10 anos mais velho do que a companheira.

Empresas há que, no processo de recrutamento, exigem às candidatas uma prova em que não estejam grávidas. A licença de parto, no regime de saúde comum, é de 12 semanas.

Na Colombia é muito frequente a actividade de "aluguer do ventre". Estas mulheres são, normalmente, muito bonitas e geneticamente fortes, condições estipuladas pelos compradores dos bebés. Existem casos de mais de 5 alugueres do mesmo ventre.

Ter um telemóvel de ultima geração é o sonho de muita gente. Chegam a concretiza-lo. O problema é que raramente têm crédito para fazer uma chamada. Então, os empreendedores ambulantes resolveram este problema social, concebendo um sistema de utilização pública de telefone móvel. Chegam a ter aparelhos de todas as redes disponíveis no mercado e uma chamada custa, por minuto, cerca de 10 cêntimos de euro. Este negócio, aparentemente "ilegal", existe em cada esquina e é um sucesso que faz parte do quotidiano do Bogotano. E o investimento é mínimo. Necessita apenas de uma cadeira para o funcionário, uma placa a anunciar o serviço e o preço, e um cordel atado aos aparelhos.




O conceito de beleza da mulher colombiana começa pelo cabelo. O mais comprido possível, liso e sedoso, mantendo o mais fielmente possível, a herança das indígenas. Existem cabeleireiros por toda a parte (cheguei a ver 4 seguidos) e os preços para secar e esticar o cabelo são económicos. A colombiana tem que ter curvas. Geralmente de estatura baixa e sexy, ambiciona exibir o corpo-viola. A pele morena é também tida como uma vantagem.




12) FUTEBOL

O colombiano adora o futebol. Sempre que ocorra uma partida da selecção nacional, a cidade veste-se de amarelo e o patriotismo sobressai-se a olhos vistos. Muitas pessoas vão trabalhar com a camisola da selecção e, à hora do jogo, é um frenesim em todo o lado.




Tive uma experiência impressionante na cidade de Medellin, onde apanhei a primeira mão da final do campeonato nacional, disputada pelas equipas rivais de morte, Nacional de Medellin e Santa Fé de Bogotá. A cidade de Medellin estava coberta de verde e branco (cores da equipa da casa). Não me lembro de ver tal rivalidade entre equipas portuguesas. De morte...

13) DELICIAS, QUE SÓ AQUI ACONTECEM

Ainda não estava cá há duas semanas, quando ocorreu um dos inúmeros episódios que me deixaram perplexa. Ao passar pela Faculdade de Engenharia Civil de uma conceituadíssima universidade, decidi ir explorar os cursos de mestrado e obter outros tipos de informação. Os seguranças (com um nível fora-de-série) pediram ajuda a uma docente que chegava à universidade e que me encaminhou à secretária. Esta pediu-me que aguardasse, que seria atendida assim que possível. Já no gabinete, apercebi-me que fui atendida pelo "número 1" daquela entidade. Com toda a simpatia, disponibilidade e bom-humor que caracteriza o colombiano. Foram 40 minutos de uma conversa super agradável e produtiva, onde recebi dicas diversas e pude ter uma primeira visão do mercado.




Nas "Busetas" (autocarros de pequeno porte, cuja viagem é normalmente paga ao motorista), os episódios incríveis são diários.

Imaginem entrar numa buseta e constatar que não se tem o valor trocado e, o motorista, muito menos. O mais comum é saltar um passageiro do seu lugar, que nunca se viu nem mais magro, nem mais gordo, e simplesmente oferecer o valor remanescente que o passageiro precisa.

Continuando com o cenário "Buseta", conseguem imaginar-se a entrar numa mais moderna (com leitor de cartão magnético) sem dar-se conta previamente e um passageiro (daqueles cuja cara nunca se viu) oferecer o uso do cartão dele, sem ideias de ser ressarcido? Num país que se auto-titule de "civilizado", a primeira barreira seria protagonizada pelo motorista, que viria com aquela lenga-lenga do "cartão pessoal e intransmissível".




O vencedor do meu "Top 3 das Busetas" é aquele mais comum de todos, porém mais difícil de acreditar. Imaginem uma buseta repleta de gente, em hora de ponta. Com pessoas contra a porta da frente, sendo impossível abri-la para o que quer que fosse. O motorista abre a porta traseira ao passageiro na paragem. Este, entrega o montante da viagem ao passageiro mais próximo e o dinheiro viaja de mão em mão, até chegar ao destino: o motorista. Este, processa o pagamento e entrega o troco ao passageiro mais próximo, que provoca a viagem inversa, até chegar ao seu dono. E esta?




Mudando de cenário, lembro-me daquela vez que saía do ginásio e apercebi-me que havia, nessa noite, um espectáculo de jazz com o conhecido Edy Martinez, num restaurante que eu já havia frequentado. Tive uma hora para ir a casa mudar de roupa e voltar. Como estava em cima de hora para convidar alguém e a prioridade daquela noite era respirar jazz, sentei-me numa mesa sozinha, jantei e apreciei um belo copo de vinho. Dois espectadores (um masculino e outro feminino) abordaram-me, em ocasiões distintas, muito convictos, como quem aborda uma artista dominicana que iria actuar no festival de jazz de Cartagena, no fim-de-semana seguinte. Vinham com o catálogo do festival, apontando entusiasticamente, a foto da tal artista. Cheguei até a sentir-me mal por desaponta-los... Ao intervalo, o próprio Edy Martinez veio ter comigo, começou a abordar-me em inglês e sentou-se à minha mesa, numa conversa agradável. Por fim, o dono do restaurante agradeceu repetidamente a minha presença, não descansando enquanto eu não aceitasse a oferta dele, de vinho francês.




Há tempos, quando fazia a minha caminhada diária pela cidade, apercebi-me que havia um evento de cinema na Cinemateca. Assuntei um dos organizadores que me informou que era privado, mas que eu teria acesso. Que aguardasse uma meia hora, para o início do evento. Pus-me no início da fila, até que chegaram dois indivíduos, a meter conversa com aquela que julgavam ser uma artista do teatro. Entre risos, fi-los ver que de artista não tenho nada e ficaram perplexos. Remataram, passados dois dedos de uma conversa bastante interessante: "bom, se não foste artista até ontem, hoje serás. Pois far-nos-ás entrar neste evento, apenas com a tua pinta de artista". Coincidência ou não, a senhora que controlava as entradas pedia convites a todos os que passavam, excepto a nós, a quem concedeu a entrada directa e com um sorriso rasgado e não nos dispensaram da foto da praxe, com o painel promocional como pano de fundo. Mas o melhor ainda estaria por vir: conhecer pessoalmente o realizador de cinema colombiano muito conhecido, o Ramón Trompetero que, por sinal, tinha visto o último filme dele em cartaz, duas semanas antes.




La Macarena é um dos meus bairros preferidos. Boémio, é conhecido por muitos como o So-Ho de Bogotá. É onde vive uma série de artistas. E fica a apenas 3 quarteirões da minha casa.





A livraria-café Luvina fica nesse bairro. É um conceito muito interessante, livraria com sofás para se tomar um café enquanto se lê um livro ou se convive com os outros clientes, que formam uma família. Oferece diversas actividades culturais, dando-se especial atenção para as tardes de sábado, onde é projectado um filme independente respeitando um tema mensal, seguido de uma tertúlia deliciosa. No dia em que conheci esta minha "casa", ainda não tinha dez minutos na livraria e já me encontrava enquadrada com os artistas, jornalistas, etc, em convívio. Cada sábado que lá vou, conheço um pintor novo. E sempre com o mesmo ingrediente, aquele tantas vezes repetido neste relato: hospitalidade, simpatia e bom-humor.



Ainda em La Macarena, recomendo o restaurante brasileiro Alô Brasil, que tive o privilégio de conhecer há pouco tempo. Mais do que a feijoada e outros quitutes daquele Brasil imenso ao fim-de-semana, realço a música ao vivo. De massajar a alma.

A Casa Portuguesa é uma casa familiar, cuja generosidade dos anfitriões fa-los abrir as portas à comunidade portuguesa, com eventos culturais de variadas espécies. É uma casa que respira arte e oferece o melhor das duas culturas, portuguesa e colombiana. O casal é artista e tem aquela sensibilidade genuína.





14) FLEXIBILIDADE E BOM SENSO

Quando fui explorar o ginásio aqui perto de casa, fui informada que "segundo as regras do estabelecimento", teria que fazer uma inscrição e pagar entre 3 e 6 meses adiantado. Como qualquer ginásio na Europa, nada de novo. Mas assim que esclareci que não vivia cá e que estaria de passagem, o bom senso arrebatou a conversa. Foi-me concedido um mês de inscrição, sem compromisso e cujo valor não era superior ao valor mensal, na modalidade de pagamento "3 meses". Passado um mês de bom usufruto, fiz uma viagem de 2 semanas ao Equador. Quando regressei, o "mês sem compromisso" começou novamente do zero.




Quando tomei conhecimento de um workshop de cinema, fiquei tão excitada com a possibilidade de concretizar um sonho, que tratei de me informar prontamente. O workshop, de 2 semanas, era gratuito e destinado aos residentes da minha zona e pediam uma série de documentos. Pensando que seria eliminada por ser estrangeira, o bom senso saltou da cartola. Fiz o workshop, ministrado por cineastas colombianos e que me fez vibrar o tempo todo.



Estes relatos ocorrem na capital da Colômbia, aquele país tão mal afamado internacionalmente e que me educa todos os dias. Hoje em dia é impossível dirigir-me a algum funcionário, sem o sorriso de orelha a orelha, pois o tratamento recebido é bem maior do que esse.

Lanço uma pergunta para reflexão, pois ainda não descobri a resposta. Como é que um país que teve tantos problemas e continua a te-los, tem gente desta natureza? Como é possível ter esta magia?

Depois destes dois meses e meio de emoções fortes seria, no mínimo, inconcebível não aceitar que acertei em cheio.

Independentemente do que virá além, este crescimento já faz parte de mim.





Bogotá, 13 de Agosto 2013










Comentários

  1. me encanto tu blog, tus fotografias... eres una persona extraordinaria. Y fue un placer conocerte personalmente y estar en contacto contigo.

    Saludos desde Mexico

    Malú

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  2. Me encanto tu blog. Tu forma de contarnos acerca de Colombia y tus fotografias. Fue un placer conocerte personalmente y permanecer en contacto.

    Abrazos desde Mexico

    Malú

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  3. Olá Nádia, é a primeira vez que escrevo num blog ... Encantadoras, a palavra certa para as tuas experiências inebriantes e que nos transportam contigo e connosco dividem um pouco desse sonho maravilhoso! Obrigado e um beijo, Francisco

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    1. Obrigada, Francisco!
      Fico feliz por ter chegado a ti :)

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  4. Uau Nady!!!!! Muito obrigada pa ter partilhado es storia. M sinti corpo repia uns dois vez. E foi perfeito de le kel texte de Cabildo Muisca no final de bo storia. Beijo, Zenne

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  5. Nadi,
    sinto-me maravilhada com todos estes momentos mágicos pelos quais tens passado. Não tenho dúvidas que a tua intuição foi real, e que essa cidade é fantástica, mas também tenho a certeza que todos esses acontecimentos se devem a ti, e a toda essa boa onda e energia que transmites.
    Obrigada por partilhares tudo isto connosco, a assim também nós crescermos e aprendermos um pouco. O mais tardar em seis meses estarei a visitar-te.

    Beijos do tamanho do Mundo e um abraço muito apertado com saudades
    Joaninha ;)

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    1. Joaninha, és a maior :)
      Obrigada pelas tuas palavras. Até já ;)

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  6. Nadiuska, quase que me sinto já "enamorada" por Bogota :-) What a fantastic experiência estas tu a ter...aproveita ao maximo, pois não há nada melhor do que levar pela vida a fora um fantastico e recheado livro de recordações.
    beijos e já te envio um email para mais informações :-)

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    1. Obrigada, amiga Sol. Espero que nos cruzemos um dia destes :)

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  7. Respostas
    1. Obrigada, Márcio! Alegra-me que tenha chegado a ti ;)

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